A mala vermelha

Paulo e Pedro 

Amigos de infância, Paulo e Pedro sempre fizeram companhia um para o outro. Paulo, com uma personalidade mais forte, sempre defendia Pedro das encrencas que ele arrumava. Era sempre assim. Nas brincadeiras de rua, na escola e depois, na faculdade e, sim, também no trabalho. Pedro arrumava confusão até na vida adulta e Paulo sempre estava lá para defendê-lo.

Os dois cursaram direito juntos e assim que formaram, tornaram-se sócios em um escritório. Foi assim durante 10 anos, até o dia em que Paulo fez sua maior loucura, uma loucura que nunca foi descoberta, mas foi capaz de abalar sua amizade com Pedro.


Uma pedra no caminho

Uma das mulheres mais bonitas da cidade, Ângela parecia não se importar com a opinião alheia. Todos comentavam sobre seus modos, que eram mal vistos pela sociedade recatada e patriarcal.

Ângela era alta, tinha mais ou menos 1 metro e 75. Andava sempre de salto alto e com um vestido até os joelhos. Todos os dias, no caminho para o trabalho, recebia inúmeros elogios. Ela, que já estava acostumada com os assédios, passava por todos os homens como se eles não dissessem nada.

Certo dia, Ângela resolveu mudar o caminho. Pegou a Avenida Anhanguera. Essa rota iria lhe custar mais dois quilômetros, mas não teria mais que escutar os assédios.

Foi no cruzamento entre a Anhanguera com a Goiás que Ângela se esbarrou em Paulo pela primeira e última vez.


O pedido 

Num dia quente de início de verão, Paulo chegou ao escritório e foi correndo até sala de Pedro, que estava concentrado com uma enorme pilha de processos em sua mesa. O amigo que chegara disse que encontrou a mulher mais linda de sua vida e precisava de sua ajuda para encontrá-la novamente.

Sem saber o que fazer para ajudar o sócio, Pedro se viu desafiado, afinal, não conseguia negar um favor sequer ao amigo. Desde pequenos fazia as vontades dele, não seria dessa vez que iria se mostrar cansado ou incompetente. Assim, Pedro disse que iria fazer o possível para saber quem era a mulher, desde que Paulo lhe descrevesse melhor a imagem da mulher.


O retrato

Pedro conseguiu. Fazia de tudo por seu amigo. Conseguiu um retrato da moça. Descobriu que ela trabalha no Banco da Cidade e é cobiçada por todos os homens que cruzam o seu caminho.

Todas as informações que descobriu sobre Ângela fizeram com que Pedro também se apaixonasse por ela. Agora não sabia se mostrava tudo para o amigo ou se ia atrás da moça. Pela primeira vez o sócio se viu contra seu melhor amigo. Esse sentimento não lhe fez bem. Não poderia acreditar que talvez teria que perder um grande companheiro por causa de uma mulher.


A manchete 

ASSASSINATO CHOCA A CIDADE. HOMEM MATA MELHOR AMIGO POR CIÚMES EM PLENA LUZ DO DIA. 

Pedro comprou o jornal como era de costume. Ao ler a manchete principal, ficou horrorizado com a história. Pensou consigo mesmo que jamais conseguiria ver o amigo com Ângela e poderia cometer o mesmo crime da notícia.

Paulo chegou atrasado. Estava de ressaca. Pedro mostrou o jornal para o amigo, que ignorou a notícia e perguntou se ele havia descoberto algo sobre a mulher. O sócio disse que ainda não, mas sentia que em breve conseguiria informações. Deixou o escritório e foi caminhar.


A dúvida

Pedro saiu pela rua com a cabeça confusa. Não sabia o que fazer. Ver a felicidade do amigo ao encontrar a mulher, mas por um lado, morrer de ciúmes, pois sabia que a mulher também lhe encantaria.

Entrou em um bar e pediu a mais forte pinga. Contou toda a história para o balconista, Barbosa, que lhe deu um conselho que nunca mais esqueceu: "Procure a sua felicidade, depois a do seu amigo. Você já se entrega demais por ele. Chegou a sua vez.".

Pronto. Esse conselho foi o suficiente para Pedro deixar o bar e ir até o trabalho de Ângela.


Os encontros

Ângela estava mais bela do que no retrato. Pedro se encantou mais ainda por sua beleza. Ao vê-la saindo, foi logo atrás. O agrado foi recíproco. A mulher também se interessou pelo homem.

Houve o primeiro, o segundo e o terceiro encontro. Pedro se viu na obrigação de contar tudo a seu amigo. Era hora dele entender que precisava abrir mão de alguma coisa por ele, pelo menos uma vez na vida.


O fim e o começo

Paulo não aceitou. Disse que ele roubou a mulher de sua vida. Pedro o questionava, dizendo que não poderia dizer isso porque nunca trocaram sequer uma palavra. Os dois decidiram não se falarem mais. Era o fim da amizade.

O tempo passava e o relacionamento entre Ângela - que não sabia nada sobre Paulo - e Pedro foi ficando sério. Os dois ficaram noivos em cinco meses de namoro.


A carta

É, meu amigo. É triste saber que uma amizade de infância se acabe por uma mulher que ambos nos apaixonamos, mas que mal conhecemos. O que vale mais para você? Nossa amizade ou essa mulher? Faça o que achas certo. Só não se esqueça que a partir de agora vou respeitar sua decisão, mas nunca vou me conformar com a presença de uma mulher que destruiu uma longa história de amizade.


A escolha

A carta foi como um mandato para Pedro. Ele se sentiu na obrigação de resolver a história. Era hora de por um fim em toda essa confusão. Tinha várias opções em sua mente, mas só poderia escolher uma. Escolheu a que julgou mais sensata, sem saber que estava no ápice de sua loucura.


Encontro

Ângela tinha o costume de visitar os pais no interior aos finais de semana. Num domingo qualquer, Pedro foi buscá-la na rodoviária. Ela o esperava com uma mala vermelha e um sorriso no rosto.

Ao entrarem no carro, Pedro prometeu que levaria a mulher em um lugar inesquecível. Um lugar onde ela jamais iria esquecer e que marcaria o romance dos dois para sempre.


Em pedaços

Enquanto Pedro dirigia, pensava. Seu coração estava em pedaços. Seu amor estava em pedaços. Pensava consigo mesmo o quanto havia mudado. Percebeu que o amor por Paulo era maior do que o que sentia por Ângela.

Chegou ao destino final. Abriu a mala vermelha e chorando, atirou-a no rio.


O perdão

Pedro foi até a casa de Paulo, que logo o convidou para entrar. Lá, conversaram muito e Pedro disse que havia terminado tudo com Ângela. Explicou que ela o abandonara para viver com outro homem no interior.

Após a conversa, Paulo perdoou o amigo. Decidiram então ir até um bar tomarem uma cerveja. Seguiram rumo ao boteco para comemorar a amizade.

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