Processo
O padre
Ele não acreditava em Deus. Era ateu. O que um ateu faz numa igreja? Eu sempre perguntava isso. Ele dizia que não tinha a quem contar seus segredos. Eu os ouvia. Não eram muitos. Eram comuns. Mandava rezar, mas acredito que ele nunca fez isso. Afinal, era ateu. Ateu não reza. Ateu. O homem era ateu e fazia confissão. Uma pena.
A vizinha
Eu nunca conversei com ele. Na verdade, uma vez. Ele não era de falar muito. Um dia chegou uma encomenda e deixaram na minha porta. Confundiram. Quando fui entregar, ele chegou. Levei um susto. Ele também. Era educado. Pegou o envelope e entrou. Só isso.
No fim da rua, se despedia dela na portinhola do barraco. Gonçalves olhava para os lados, preocupado em estar sendo vigiado. Depois pensava: "Até parece que alguém se importa com a minha vida. Afinal, um velho, viúvo e sem muito dinheiro".
Abraçava a mulher, que trancava a portinhola e via o homem deixando a casa.
Era sagrado. Toda segunda ele descia a Dom Pedro, passava no bar, comia dois pães de queijo e tomava um cafezinho sem açúcar. Barbosa, o dono do boteco, sempre comentava as manchetes do jornal que o moleque trazia. Gonçalves deixava suas moedas e sempre dizia: "Uma boa semana a todos!" e saía. Continuava a descida.
Ninguém mais viu Gonçalves. Durante cinco meses não apareceu em seu apartamento. Poucos sentiram sua falta, apenas a vizinha, o padre, e Barbosa, o dono do boteco.
Numa manhã de segunda, Angelina, uma senhora muito parecida com Gonçalves, chegou ao prédio. Cumprimentou a única vizinha que, curiosa, perguntou se conhecia o homem. Angelina, bem tímida, respondeu que ele era seu irmão. Tirou a chave da bolsa e entrou.
O apartamento era minúsculo. Uma sala, um quarto um banheiro e uma cozinha. Na mesa da cozinha estava um caderno. Angelina puxou a única cadeira, se sentou e abriu.
19 de abril
Eu não sei porque diabos deixaram a encomenda no apartamento da vizinha. Se ela descobrisse seria meu fim. As luvas são charmosíssimas. Exatamente como na foto que vi. Só Deus sabe como a costureira conseguiu acertar o tamanho. Couberam direitinho em minhas mãos. Angelina vai amar.
28 de abril
O padre acha que sou um incrédulo. Ótimo. Eu quero enganá-lo. Assim, vai enganar a todos. Se perguntarem algo a ele vão saber que eu não passava de um homem comum, sem muitos segredos. Não vai ter escândalo. Vai ser tudo discreto como bem quero.
A senhora colocou o caderno em cima da mesa. Sorriu. Deixou o apartamento e desceu as escadas.
Ele não acreditava em Deus. Era ateu. O que um ateu faz numa igreja? Eu sempre perguntava isso. Ele dizia que não tinha a quem contar seus segredos. Eu os ouvia. Não eram muitos. Eram comuns. Mandava rezar, mas acredito que ele nunca fez isso. Afinal, era ateu. Ateu não reza. Ateu. O homem era ateu e fazia confissão. Uma pena.
A vizinha
Eu nunca conversei com ele. Na verdade, uma vez. Ele não era de falar muito. Um dia chegou uma encomenda e deixaram na minha porta. Confundiram. Quando fui entregar, ele chegou. Levei um susto. Ele também. Era educado. Pegou o envelope e entrou. Só isso.
Descendo a Dom Pedro
No fim da rua, se despedia dela na portinhola do barraco. Gonçalves olhava para os lados, preocupado em estar sendo vigiado. Depois pensava: "Até parece que alguém se importa com a minha vida. Afinal, um velho, viúvo e sem muito dinheiro".
Abraçava a mulher, que trancava a portinhola e via o homem deixando a casa.
Era sagrado. Toda segunda ele descia a Dom Pedro, passava no bar, comia dois pães de queijo e tomava um cafezinho sem açúcar. Barbosa, o dono do boteco, sempre comentava as manchetes do jornal que o moleque trazia. Gonçalves deixava suas moedas e sempre dizia: "Uma boa semana a todos!" e saía. Continuava a descida.
O diário e as luvas
Numa manhã de segunda, Angelina, uma senhora muito parecida com Gonçalves, chegou ao prédio. Cumprimentou a única vizinha que, curiosa, perguntou se conhecia o homem. Angelina, bem tímida, respondeu que ele era seu irmão. Tirou a chave da bolsa e entrou.
O apartamento era minúsculo. Uma sala, um quarto um banheiro e uma cozinha. Na mesa da cozinha estava um caderno. Angelina puxou a única cadeira, se sentou e abriu.
19 de abril
Eu não sei porque diabos deixaram a encomenda no apartamento da vizinha. Se ela descobrisse seria meu fim. As luvas são charmosíssimas. Exatamente como na foto que vi. Só Deus sabe como a costureira conseguiu acertar o tamanho. Couberam direitinho em minhas mãos. Angelina vai amar.
28 de abril
O padre acha que sou um incrédulo. Ótimo. Eu quero enganá-lo. Assim, vai enganar a todos. Se perguntarem algo a ele vão saber que eu não passava de um homem comum, sem muitos segredos. Não vai ter escândalo. Vai ser tudo discreto como bem quero.
A senhora colocou o caderno em cima da mesa. Sorriu. Deixou o apartamento e desceu as escadas.
Subindo a Dom Pedro
Subindo a Dom Pedro, Angelina parou no boteco. Comeu dois pães de queijo e tomou um cafezinho sem açúcar. Barbosa, o dono do bar, comentava as manchetes do jornal que o moleque trouxera. A senhora deixou algumas moedas e disse: "Uma boa semana a todos!". Barbosa olhou assustado para Angelina, que saiu sem olhar para trás. Continuou a subida até o fim da Dom Pedro.
Chegando no barraco, encontrou uma mulher que a esperava na portinhola de fora. As duas se cumprimentaram com um enorme sorriso e entraram.
Chegando no barraco, encontrou uma mulher que a esperava na portinhola de fora. As duas se cumprimentaram com um enorme sorriso e entraram.
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