O ipê

Era setembro. Eu estava sentado no banco do parque, em frente a um ipê amarelo quando ela chegou. Parecia apreensiva. Foi direta.

– O que você quer comigo?
– Senta – eu disse.

Sentou-se do meu lado e colocou a bolsa no colo.

– Então. O que você quer?
– Conversar.
– Conversar... Eu sei que você quer conversar! Tô perguntando o que você quer de mim com essa conversa. Entendeu?
– Entendi.
– Então fala! Você não é assim tão calado. Tá sempre cheio de argumentos. O que você quer? – estava impaciente.
– Quero, sei lá. Ver você. Ver se a gente pode, sei lá, tentar...
– Olha aqui! Eu não tô te entendendo. E, por favor. Olha pra mim. Não olha pro lado. Você me chamou pra conversar, não é? Eu tô aqui, então, POR FAVOR, esteja aqui também. Olha pra mim enquanto eu falo.

Fiquei paralisado. De fato eu não conseguia encará-la. Preferia olhar para o céu. O tempo estava aberto e o sol ardia.

– Ouviu o que eu disse?
– Ouvi.
– Não parece.

Olhei para o lado. Um. Dois. Dois passarinhos compartilham agora o mesmo galho de um ipê amarelo. Fiquei em silêncio.

– Certo. Acho que você não tem nada pra me dizer. Eu já vou. Você nem tá se dando ao trabalho de olhar pra mim.
– Pode ir.
– Como é que é?! – ela perguntou assustada.
– Pode ir.
– Você é maluco! Irresponsável! Me chamou aqui pra não falar nada e ainda me manda ir embora. Meu deus. MEU DEUS! Como sou burra!
– Somos.
– Como?! – ela parecia não acreditar.
– Somos dois burros. Eu, por não conseguir dizer nada. Você... Você por vir até aqui. Por escutar apenas o meu silêncio.
– Eu não acredito! Eu tô chocada! Então você vai mesmo assumir que me fez de idiota me chamando pra conversar?
– Pode ir – eu disse sem demonstrar nenhuma expressão.
– Você se supera! – firmou a mão na bolsa que estava em seu ombro esquerdo – Você se supera! – deu as costas e foi embora.

Depois disso eu a vi mais uma vez. Acompanhada por outro cara. Parecia feliz. Ela até sorria enquanto ele falava. Ele até que olhava pra ela. Deve ser isso que a deixava feliz. Por isso devem ter dado certo. Que bom. Fico feliz. De verdade.

Eu? Eu quase todo dia estou naquele mesmo banco do parque. Engraçado. Sempre vejo dois passarinhos compartilhando aquele mesmo galho daquele mesmo ipê amarelo. Não, ele não está amarelo agora. Ainda estamos em maio, mas em setembro ele floresce. Eu sei que ele é amarelo. É que nem gente. Eu não preciso ser quem eu sou o tempo todo pra todo mundo entender quem eu sou de verdade. A gente nem sempre é o que é no momento em que a gente está sendo alguma coisa. Ah. Quer saber? Não adianta nada eu falar. Vou tomar meu remédio.

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