A Pessoa Mais Insuportável Que Eu Já Conheci Na Minha Vida

Eu odeio o vento daquele lugar. Ele sabe disso. E eu tenho certeza de que esse foi o motivo de ele ter marcado esse encontro lá. Eu já iria começar a discussão perdendo, afinal, eu não ficaria confortável com o vento. Xeque-mate. Mas eu iria dar a volta por cima. Decidi que isso não iria me abalar.

Parece pouco, mas realmente odeio o vento que faz no alto do Convento da Penha. De verdade. Poxa, tantos lugares nessa cidade para marcar uma conversa. Respirei fundo ao ler a mensagem. Respondi apenas com um OK. Ele odiava respostas curtas.
Nos últimos dias era assim. Um provocava o outro sem parar. Não é por nada não, mas eu estava bom de argumento. Se fosse uma competição, minha vitória seria garantida. Mas não era. Era vida real mesmo. Era um relacionamento em crise. Era uma vez um casal feliz que se conheceu no início da primavera passada.
Cheguei. Chegamos. Eu não disse nem oi. Comecei no ataque.
­― Por que aqui? – perguntei.
­― Como assim?
­― Por que marcou essa conversa logo aqui? Você sabe que eu odeio esse vento.
­― Então você tá achando que eu marquei aqui só pra te provocar?
­― E não foi?
­― Foi. Foi embora toda a minha vontade de tentar falar com você.
­― O que é? O vento levou?
­― Quer saber? Queria muito que ele me levasse daqui. Longe de você. Agora chega.
­― Cheguei. Já você parece que está em outro lugar. Não respondeu minha pergunta ainda.
­― Você é a pessoa mais insuportável que eu já conheci na minha vida.
­― E quando foi que você se deu conta disso?
­― Quando trocamos as primeiras palavras.
­― Por que continuou?
­― Porque sou burro.
­― Você acha?
­― Acho.
­― Então espera. Será que você me chamou pra cá porque queria mesmo me provocar ou simplesmente esqueceu que eu odeio esse vento? Se esqueceu, dou um desconto, afinal, você é burro, não é?
­― Você me deixa sem palavras.
­― Ah… Que saudade. Você sempre dizia isso quando nos conhecemos.
­― É. Só que agora me deixa sem palavras porque você me irrita. E como ainda estou são, fico calado. Se eu começar a soltar tudo o que eu tenho pra dizer, você estaria na merda.
­― Mais?
­― Muito mais.
­― Então você acha que eu estou na merda?
­― Não foi pra isso que eu te chamei.
­― Responde alguma pergunta! Por favor!
­― Já reparou uma coisa? EU te chamei aqui. EU. E até agora você não me deixou falar nada.
­― Fala. Só que fala mais alto porque esse vento não me deixa escutar bem. Ele deu as costas. Foi embora. Do nada. Não tinha nem começado. Nem sabia o que ele tinha de tão importante pra me dizer no alto do Convento da Penha.

Naquele pôr do sol. Aquela vista mais linda da cidade… Espera. Será que não era pra ser uma discussão? Tirando o vento, tudo lá era bonito. Eu sempre elogio aquela paisagem. Não era pra ser uma discussão? Será? Meu deus. Estou péssimo. Eu realmente devo ser a pessoa mais insuportável que eu já conheci na minha vida.

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