Ventos do Sudeste

Em meio a um dia cansativo de trabalho, cobri os olhos com as mãos e pensei no quão eu estava cansado. Ao mesmo tempo, meu senso crítico insistia em dizer que era apenas um drama de um jovem rapaz de 23 anos que achava que estava no auge de uma crise, sendo que ainda mal tinha começado a viver.

Ignorei os pensamentos que me colocavam pra baixo, levantei a cabeça e decidi aceitar a situação. Decidi aceitar que sim, eu precisava de férias. Empurrei o teclado, puxei minha agenda, peguei meu lápis e copiei o calendário do mês de outubro. Restava agora decidir para onde eu iria.
Caçula de 3 filhos, cresci vendo meu pai sempre tendo que “dar um duro danado” para conseguir cuidar da gente. Mesmo morando com minha avó e ela nos ajudando, muitas vezes era difícil para ele. E como todos sabem, viajar ainda é considerado um luxo no Brasil, por isso, durante minha infância nós não tínhamos esse costume, a não ser ir para a casa dos nossos parentes em Brasília ou São Paulo, o que pra mim já era incrível e sou muito grato por todas essas viagens.
Aos 23 anos, além de Goiás, meu estado, eu já conhecia São Paulo, Distrito Federal, Rio de Janeiro e Bahia. Tinha consciência de que minha verba só me levaria até algum país vizinho e ainda poderia passar algum perrengue. Pensando mais friamente, fiz o seguinte questionamento “como viajar para outro país se eu conheço pouco do meu?”. Foi aí que me veio a ideia de criar um roteiro diferente, mas que marcou minha vida: passear pelas quatro capitais do sudeste. 

RIO DE JANEIRO - 27/09 a 03/10
Mala e roteiro prontos, era hora de partir para o primeiro destino dessa viagem inesquecível: Rio de Janeiro. Mesmo tendo família no Rio, preferi me hospedar em um hostel na Zona Sul, assim eu ficaria mais à vontade para seguir meu roteiro, até porque meus tios moram na Barra, o que complicaria um pouco minha vida. Das outras vezes que fui ao Rio, meu tio me levou pra fazer um passeio de moto da Barra até Grumari. Foi incrível, mas dessa vez, era hora de conhecer o Rio histórico.
A primeira ideia foi me hospedar em Copacabana, só que minha amiga Nathália me convenceu a ficar em Botafogo. Como eu não sou de praia, acabei acatando a sugestão. Quer saber? Foi maravilhoso. Escolhi o Hospedaria Rio, um lugar muito bem localizado, simples, mas com muito conforto, além de um bom atendimento e café manhã bem completo.
Assim que cheguei no hostel, guardei minhas coisas, fui até a estação de metrô e parti para o meu primeiro encontro comigo mesmo. Já estava programado. Na minha playlist da viagem coloquei a música Copacabana, de Marcelo Camelo. Queria tudo sincronizado. Enquanto as escadas da estação Copacabana me levavam para fora, eu escutava “sinto Copacabana por perto é o vento mar... será que a gente chega?”. A sensação era de que eu estava num musical. Uma delícia.
Depois disso, parei num quiosque em frente ao Copacabana Palace e tomei uma cerveja enquanto pensava na vida, em ideias, no mar e no melhor: em nada. Isso sim é tirar férias! Se tem uma coisa que estou aprendendo é valorizar os momentos do vazio. Acredite, é bom demais.
No segundo dia de viagem, fui passear pelo centro. Da vez anterior em que estive no Rio, conheci a Biblioteca. Desta vez, visitei o MAM, onde tinha uma exposição sobre a história do samba no Rio de Janeiro. Assim que entrei, um enorme corredor me empurrava para dentro ao som de muito samba. E foi samba 100% do tempo.
Depois do MAM, meu próximo destino foi o Museu do Amanhã, que não consegui visitar da última vez que fui, em 2016. O lugar é lindo, mas quem espera um acervo de obras não vai encontrar muita coisa. A ideia do museu é ser bem didático, explorando questões ambientais, evolucionistas, além de conscientizar os visitantes sobre os rumos que o planeta Terra está tomando.
Em seguida, fui almoçar na Cafeteria Colombo, que eu já havia conhecido também da última vez, mas antes só tinha comido alguns salgadinhos. Dessa vez eu precisava de mais energia.
Saindo de lá, peguei um Uber em direção à Feira de São Cristóvão.
Sábado foi dia de conhecer o Parque Lage e o Jardim Botânico e no fim do passei, fiz uma paradinha no La Byciclette.
Domingo, finalmente o tempo resolveu abrir e foi possível conhecer o Cristo Redentor. Eu estava bem nervoso, afinal, não é todo dia que a gente vai conhecer uma das Sete Maravilhas do Mundo. Na estação de metrô, encontrei com uma família de chilenos que estava perdida e fomos juntos até o fim do passeio.
Saindo da estação, várias pessoas nos abordaram dizendo oferecer o melhor roteiro até lá. Depois de ser alertado pelo pessoal do hostel, preferi escolher o oficial. O clima estava perfeito, fiquei um pouco assustado com a quantidade de pessoas e fotógrafos que ficam lá em cima, mesmo assim é um passei que vale a pena.
Assim que voltei do Cristo, arrumei minhas malas e peguei o metrô até a Barra. Agora era hora de ficar com a família antes de partir para o próximo destino.
No último dia, o marido da minha prima me convidou para um passeio, adivinhem, em Botafogo. Pegamos o metrô da Barra até lá e fomos peregrinar por diversos bares. Conheci pessoas, bebi e ainda ganhei adesivos de "Ele Não".


VITÓRIA E VILA VELHA - 03 a 06/10
Dentro de poucas horas eu sentiria os ventos mais intensos da minha vida, exatamente às 9h30 da manhã, na porta do Aeroporto de Vitória, enquanto eu esperava minha tia.
Pronto. Agora eu estava em um dos destinos mais lindos que conheci na minha saga pelo Sudeste. E eu pensava que o Espírito Santo seria um dos estados brasileiros que nunca conheceria, mas, felizmente, bons ventos me levaram até lá.
Se eu tivesse que escolher uma palavra para resumir Vitória e Vila Velha, essa palavra seria frescor. Essas duas cidades separadas pela Baía de Vitória carregam muita história, mas nos mantém renovados com os ventos mais fortes e refrescantes que eu já senti.
Logo no primeiro dia, meu tio me levou para caminhar pela Curva da Jurema e tomar uma água de coco. Depois fui rumo ao ponto mais alto (também no sentido literal da palavra) da viagem, o Convento da Penha. Lá de cima, tive o prazer de fotografar um pôr do sol maravilhoso, rodeado por cidade, mar e pássaros. Já no início da noite, caminhei pela Praia da Costa e conheci um pouquinho do fim do dia dos moradores capixabas.
No dia seguinte, foi a vez de fazer a caminhada pelo centro histórico de Vitória. Conheci o Palácio Anchieta, com muita história sobre as missões jesuíticas no Brasil, o Teatro Carlos Gomes, a Escadaria Maria Ortiz, e a Catedral Metropolitana de Vitória.
Saindo de Vitória, partimos para Vila Velha, onde conheci a Fábrica da Garoto e o Museu da Vale.
Voltando para Vitória, minha tia me levou para conhecer a Ilha das Caieiras, um lugar muito agradável, com muitos restaurantes na beira do mar.
Chegando em casa, minha tia preparou uma moqueca com frutos do mar fresquinhos, me dando energia para passear pelo Triangulo das Bermudas à noite com minha prima.
Nessa jornada pelo Sudeste, minha passagem pelo Espírito Santo refrescou minha alma. Matei saudade de tios queridos, tomei banho de mar e peguei um trem rumo à Minas sentindo que em breve eu voltaria.


VIAGEM DE TREM​ “Coisas que a gente se esquece de dizer; frases que o vento vem às vezes me lembrar; coisas que ficaram muito tempo por dizer na canção do vento não se cansam de voar...” No momento em que aquele trem cruzou a fronteira entre Espírito Santo e Minas, meu coração deu uma acelerada. Com uma playlist carregada de Milton Nascimento, Lô Borges e Flávio Venturini, eu passava pelas margens do Rio Doce. Pronto. Agora eu estava em Minas Gerais. Pela janela eu via pequenas cidades, via a natureza, via o Rio Doce e (infelizmente) algumas manchas de barro. Tudo o que eu pensava era “como esse país é grande”. Afinal, há poucos dias eu estava sentindo o calor do Rio de Janeiro, depois conhecendo as peculiaridades de Espírito Santo e, agora, passando pelo famoso Vale do Aço. Depois de uma rápida estadia em Ipatinga, na casa de um grande amigo, peguei o trem novamente. Agora meu destino seria Belo Horizonte. Durante todo o trajeto fiquei sem sinal. Mais uma vez nesta viagem eu teria que conviver com a minha própria companhia. E foi uma delícia. De Vitória a Ipatinga, fiquei na classe econômica e confesso que não é muito confortável. Além disso, o restaurante dentro do trem não aceita cartões, então, prepare-se para leval dinheiro em espécie. No trajeto Ipatinga-Belo Horizonte, decidi comprar um bilhete executivo. A viagem foi muito mais confortável, com poltrona reclinável e individual. Assim que o 4G voltou, todos os passageiros olhavam ansiosamente os resultados das eleições. Ganhava Romeu Zema, para governador de Minas Gerais, e, na presidência, iríamos para o segundo turno, com Fernando Haddad e Jair Bolsonaro.


BELO HORIZONTE - 07 a 10/10 Logo depois do desembarque, na Praça da Estação, peguei um Uber e fui em direção à Savassi, me hospedei no BR Hostel, onde conheci pessoas incríveis. Depois de uma boa dormida, assim que amanheceu, fui visitar o meu primeiro destino, o Mercado Municipal de Belo Horizonte, considerado o terceiro melhor do mundo (!). Posso dizer com toda a certeza: que lugar, meus amigos. Que lugar... Lá tive a oportunidade de experimentar várias cachaças, queijos, tomei a famosa cerveja Backer (bem antes de toda a polêmica) e comi o famoso fígado com jiló. A noite belo-horizontina é agitadíssima. Em plena segunda-feira, fui até uma casa de forró. Detalhe: a banda começou a tocar depois da meia-noite, numa SEGUNDA! Lá aprendi alguns passos, dancei com muita gente e terminei o dia feliz da vida depois de muita diversão. No segundo dia, fui até a Praça da Liberdade, onde senti o quão forte é a história que os mineiros carregam e o quanto são orgulhosos de tudo o que viveram e ainda vivem. Infelizmente, o local estava interditado devido a obras, mas consegui espiar um pouquinho. Neste mesmo dia, conheci o Memorial Minas Gerais, o Museu Mineiro, o Parque Municipal, o Museu de Artes e Ofícios, a famosa (e nem tão especial) Sorveteria São Domingos e, por fim, a Casa Fiat de Cultura, onde tinha uma linda exposição sobre São Francisco de Assis. Foi neste mesmo dia que recebi a notícia que mudaria minha vida: fui contratado para trabalhar em São Paulo. Meu tempo foi curto em BH. Faltou conhecer a Pampulha, por exemplo, mas como eu amei a cidade, pretendo voltar em breve.


SÃO PAULO - CHEGANDO PARA FICAR
Depois de tantas cidades e caminhos inesquecíveis, cheguei ao último destino deste roteiro​ e, como eu disse antes, cheguei em São Paulo para ficar.
O Rio de Janeiro me alegrou. Espírito Santo me refrescou com seus bons ventos. Minas anunciou as mudanças que estariam por vir.
São Paulo acabou ficando sem roteiro. Preferi aproveitar os dias com a família e deixei os destinos planejados para quando eu viesse morar aqui.

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