Conclusão
Eu iria abrir uma garrafa de vinho e dançar sozinho em casa, mas a única caixa de som está sem bateria. Tentei carregá-la, mas não encontrei o cabo. Deve estar jogada em algum canto deste maldito apartamento. Sabe, eu não faço questão nenhuma de procurar. Hoje eu estou com zero vontade de me estressar. Vai que no meio da busca eu me esbarro emalguma coisa que eu não quero ver? Não, não, não, não, não... Já estou tropeçando em muitos desgostos ultimamente. Tive outra ideia melhor.
Depois de decidir que não vai ter nem música e nem vinho, vou até o banheiro e arranco minha roupa. Abro o registroesquerdo, espero a água esquentar. Esquentou. Abro o direito e começo a pensar. Droga. Eu não deveria fazer isso. Parececoisa de gente sem amigos. Gente sozinha. Não sei, mas eu preciso, sabe? Eu preciso me divertir! E quero fazer isso.Quem disse que pra ser feliz a gente precisa ter alguém? Quer saber? Eu vou sim. Foda-se!
Acho que a água esquentou demais. Depois a pele fica a mesma merda de sempre. Aí vou precisar comprar os mesmoscremes de sempre pra resolver os mesmos problemas dermatológicos de sempre que só saem quando na verdade eu douum tempo para as mesmas paranoias de sempre. Que caos. Eu adoro. E odeio. E assim vou passando boa parte do meutempo.
Eu falo, falo, falo comigo mesmo e nunca chego a uma conclusão. Mas quem disse que sempre é preciso chegar a umaconclusão? Num encontro com os amigos, por exemplo, numa conversa qualquer, ninguém chega no final e diz:“concluindo nossa conversa, decidimos que todos devemos aceitar que a vida de cada um de nós está uma merda, todosnós estamos bêbados devemos ir embora pra casa”. Pensando bem, seria até uma boa ideia em certezas ocasiões. Naqueleaniversário da Ritinha, por exemplo? Como foi horrível, meu deus...
Por falar em conclusões, de onde tiraram essa ideia de que hora do banho é hora de tomar decisões ou pensar na vida? Aágua do mundo está acabando. Desligo os dois registros de uma vez, encho minha boca de água e cuspo pela janela. Ops!Às vezes eu esqueço que moro num apartamento. Bom, até hoje ninguém reclamou. Puxo a toalha que estava penduradano box. Preciso trocar. Preciso trocar tudo. Trocaria minha cara se eu pudesse. Cara de pau. Tenho saudades de quando eutinha vergonha de certas coisas. Imagina só... Sair sozinho?
Depois de seco, vem o de sempre. Perfuminho, creminho, escovinha no cabelo, pomadinha, desodorante, cueca e... Droga.Não lavei roupa ontem e, provavelmente, a que eu queria usar está suja. Bom, se hoje for meu dia de sorte no amor, euvou encontrar alguém de qualquer jeito, então, foda-se a roupa. Vou colocar qualquer uma. Quem me amar vai me amarcomo eu estiver.
Pronto. Estou socialmente aceito. Menos meu apartamento. Mas a prioridade sou eu. Se estou satisfeito com essabagunça, que fique assim. Até porque, provavelmente, não vou receber ninguém aqui hoje. A não ser que eu tenha sorteno amor. Por que eu estou pensando nisso de novo, meu deus? Preciso chamar o Uber.
Boa noite. Não precisa ligar o ar. Gosto de sentir o vento. Entre ahams, nossa-senhoras, esse-pais-está-complicado eoutros termos clichês, faço uma viagem três estrelas, mas dou cinco porque não quero justificar o porquê de ter dado umanota baixa. Será que fiz errado? Não sei. Não preciso entrar nessa questão agora. Preciso? Não, não preciso.
Assim que caminho em direção a fila, me sinto até um pouco animado. Ah, mas não é possível. Ele e outro. Eu nãoenxergo direito sem meus óculos a noite. Será que é ele mesmo? Eu não sei. Eu deveria ter vindo de óculos. Na verdade,eu deveria ter vindo aqui? Imagina se ele me vir sozinho? Sair sozinho é coisa de gente louca. Moça, aquele cara ali temuma pinta do lado... Nada não, desculpa! Decido ir embora. Sei lá. Não preciso saber se era ou se não era. Nem tudoprecisa de uma conclusão. Fui comer coxinha. Não sei, mas acho que isso é uma conclusão.
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